quinta-feira, 29 de março de 2007

Uma doença un-.Chique

O Henrique, meu marido, tem SIDA.

Sim, é isso mesmo que leram: O Henrique tem sida.
A Fafa e a Fifi ainda não sabem e eu talvez não lhes viesse a contar se não fosse por aqui.

Estou Farta! Sim, farta... Em pequena era o cancro que me atormentava a vida, agora é o facto do meu Henrique ter SIDA e de eu ter 90% de hipóteses de também ter.

Às vezes apetece-me fugir chiquemente pela porta das traseiras e nunca mais ninguém me por a vista em cima. Sim, deixavam de sofrer as pessoas com as minhas doenças e eu deixava de sofrer a dobrar por ver os outros preocupados.

Hoje vou fazer o teste para ver se tenho ou não SIDA, e se tiver, nem sei o que sou capaz de fazer. Por um lado tenho de ficar ao lado do meu marido, para o apoiar, mas, e a mim? Quem me apoia? Não quero chatear os outros com os meus problemas.

Às vezes, apetece-me morrer.


quarta-feira, 28 de março de 2007

O meu dilema .Chique - Parte 3

Lurdes Rodrigues, minha mãe, sempre fora uma mulher honesta e dedicada à sua família. O meu pai, Mário Rodrigues, sempre fora trabalhador e um homem de valores. Mas ambos guardavam um segredo… Um segredo que permanecera assim até àquela data.

* * *

Não quis acreditar no que os meus olhos me mostravam. Não podia ser verdade. Simplesmente, não podia. Mas era… A pura verdade. Diante dos meus olhos. Mas… o que aconteceu, realmente? A Fifi conta-vos, não se preocupem.

A tarde iniciava-se calma. Provavelmente, muitos espanhóis un-chiques que imigraram para Portugal dormiam a sesta, deitados nos bancos ou nas relvas fortalecidas por fertilizante natural (leia-se cocó de cão) da cidade de Cascais, quando se deu o acontecimento que iniciaria a mudança da Fafa.

Aquilo que eu e a Bá vimos foi uma coisa extremamente chocante na época mas agora profundamente normal: duas mulheres aos beijos.
.Choque
E quem eram as duas mulheres?, perguntam-se vocês. Pois... eram a Fafa e uma rapariga da nossa turma, a Marta. Aos beijos, ali, entre os arbustos. Deitadas na relva. Felizes. Não acreditava.
Quando nos viram, foi como se vissem o Diabo un-chique. Levantaram-se e afastaram-se rapidamente, lembro-me precisamente como se estivesse a acontecer agora, e Marta saiu dali. Por seu lado, Fátima apanhou os cadernos que tinha na relva e levantou-se. Nem nos olhos nos olhos. Limitou-se a caminhar para dentro da escola, sem nos dirigir uma palavra. Estava, claramente, envergonhadíssima.

- Credo... Coitada. - disse a Bá.
- Estou em choque! - assenti eu. - Mas...
- Precisamos de falar com ela, sei lá... Penso que é uma coisa normal!
- Tão normal como eu tomar banho sem água. - respondi.

A tarde passou, lentamente. As aulas eram cansativas, e a matéria era difícil. Por vezes, eu e a Bá trocávamos olhares... Aqueles olhares a denunciarem que pensávamos na mesma coisa: naquilo que víramos depois do almoço. Então, num intervalo, deixamo-nos ficar na sala à espera da Fafa, com a intenção de falarmos com ela sobre aquilo. Os nossos colegas saíram, sedentos por minutos de diversão a comentar as roupas dos outros, e nós esperámos por ela, que nada mais fez do que pegar na pasta e sair da sala, ignorando-nos.

- Enfim... - disse eu.
- Vamos atrás dela. - disse a Bá, arrastando-me para fora da sala.

Corremos pelo corredor, de mãos dadas e com as nossas saias a balançar-se conforme os movimentos das nossas pernas. Olhámos em volta. Continuámos a correr. Parámos.

- Onde raio se meteu ela? - perguntou-me Bá.
- Ali! - gritei eu, histerica e un-chiquemente. - Na máquina dos sumos light! - olhámos as duas.

Caminhámos por entre a multidão de estudantes que falavam entre si sobre banalidades, como numa escola típica de Cascais, e aproximámo-nos de Fafa, que, depois de comprar o sumo e, vendo-nos, começava a fugir novamente.

- Espera! - disse eu.
- Precisámos de falar. - concordou a Bá.

Fafa olhou para nós, claramente envergonhada. Procurámos um sítio isolado onde pudéssemos falar calmamente as três, sem ninguém para nos interromper. Minutos depois, num compartimento da casa de banho das raparigas un-chiquemente degrada, olhávamo-nos. Foi a Bá a primeira a falar.

- Olha... não te preocupes. Nós compreendemos aquilo que vimos...
- Desculpa, mas não compreendem nada! - gritou a Fafa. - Uma rapariga com uma rapariga, onde já se viu isso?! Se quiserem, podem gozar comigo à vontade. Eu sei que é errado e mere...
- Fá, cala-te. - disse eu. - Nós somos tuas amigas, e, como a Bá disse, compreendemos.
- E aceitamos. - disse a Bá.
- Por isso, apoiamos a vossa relação a cem por cento.
- E guardamos segredo. - concordou a Bá.
- Credo, somos melhores amigas! Não tens nada que nos esconder, sabes disso!

Fafa começou a chorar e abraçou-nos às duas com uma força enorme.

- Obrigado, amigas! - gritou.

Nesse dia, só pude estar com Norberto ao final das aulas. Ele levou-me até casa de mãos dadas e limitámo-nos a apreciar a paisagem que nos rodeava. Eu, no entanto, vivia uma ilusão, como o descobriria mais cedo do que poderia imaginar...

À noite, jantei, silenciosa, e permaneci no quarto deitada na cama a observar as estrelas, pensando em tudo. Os meus pais não me disseram uma única palavra ao jantar, e continuavam a proibir-me de sair de casa sem ser para ir à escola. Definitivamente, a minha vida podia estar bem melhor. O céu estava belo, e calmo. Uma calma que a minha vida perdera uns dias antes. E ainda muita coisa faltava acontecer.

No dia seguinte, tivemos aulas apenas de manhã. Mas, como tínhamos combinado estudar juntas nas escola as três, fomos almoçar a um café ali da zona e, enquanto comíamos pizza e bebíamos sumo, conversávamos.

- Então, quem diria... A Fafa a meter-se nestas coisas. - disse eu.
- Vocês pensam que eu sou certinha... Mas vocês não conhecem o meu lado un-certinho.
- Credo, Fafa. - disse a Bá. - Que segredos escondes tu?
- Muitos. - disse a Fafa, e rimo-nos as três. Mal sabíamos que, apesar de ela estar a brincar quando disse aquilo, a vida lhe destinava algumas surpresas desagradáveis (as quais ela já contou na sua história).

Pagámos a conta e abandonámos o café. O dia estava solarengo. Continuámos a caminhar para a escola a conversar. Porém, uma mulher intromete-se no nosso caminho. Arminda, aquela mulher.

- Continuem. - disse eu.
- Tens a certeza? - perguntou a Bá.
- Tenho. - respondi.

E assim o fizeram. Aproximei-me dela e ela apenas me disse:

- Vem comigo, preciso de mostrar-te uma coisa.
- Mas vou ter aulas!
- Faltas.
- Não posso!
- É urgente.
- Não está a entender... os meus pais matam-me!
- Que matem. - disse, e puxou-me pelo braço. Caminhámos pela cidade durante quinze minutos, e parámos perto de uma casa velha.

- O que é isto? - perguntei.
- Não querias provas? - disse-me, e puxou-me para dentro de casa.

A casa era un-chiquemente decorada. Tinha mobília velha e havia pó por todo o lado. Caminhámos por um corredor até à sala e ela sentou-se no sofá.

- Senta-te também. - disse-me.
- Prefiro ficar de pé... - respondi, vendo uma barata no sofá ao lado.

Começou a mostrar-me fotografias de uma bebé e a falar, a contar a sua história. Já não me lembro direito como ela disse as coisas, mas falou muito. Segundo Arminda, ela era uma brasileira a tentar a sua sorte em Portugal quando me teve. Mas, era pobre. Tinha poucos estudos. E, além disso, estava no nosso país ilegalmente. Então, a única solução que arranjou antes de partir para o Brasil foi abandonar-me num convento.

- E como espera que acredite em tudo isso...? - perguntei.

Ela mostrou-me mais uns documentos e convenceu-me. Mostrou-me o meu registo de nascimento e... era verdade. Meu Deus, era verdade! Eu tinha sido adoptada... e a minha verdadeira mãe era uma mulher pobre, que vivia cá ilegalmente. Não. Os meus pais verdadeiros foram aqueles que me criaram. Sim. Lurdes e Mário Rodrigues, não uma mulherzinha qualquer que chegava ali e me contava aquelas histórias. Exactamente. O que eu estava ali a fazer, então? Apercebi-me naquele momento de que fora um engano ter vindo com aquela desconhecida.
Corri para a porta.

- Filipa, espera! - gritou ela.

Não olhei para trás. Corri o mais depressa que pude para a escola. Nas horas seguintes, procurei não pensar no assunto. No final das aulas do dia seguinte, eu e as outras duas conversávamos enquanto nos dirigíamos para a paragem de autocarro.

- Então, Bá, como vai o tratamento? - perguntou Fafa.
- Vai bem... amanhã vou novamente ao hospital, de manhã...
- E tu, Fifi, como vai a tua relação com o Pascoal?
- Não lhe chames isso! - gritei. - Odeio esse nome!
- Okay, okay... Estava só a brincar! - respondeu ela.
- Mas diz lá, como vai. - continuou Bá.
- Bem... ficámos de nos encontrar logo para estudar. - respondi. - Então e tu e a Marta?
- Estamos bem. Estivemos juntas há bocado, às quatro.

E assim continuámos. Depois de sair do autocarro, caminhei um pouco até chegar ao meu prédio. À porta, encontrei Norberto.

- Olá. - disse eu.
- Olá. - respondeu ele.

Olhei em volta. Estávamos só nos os dois ali. Era seguro. Beijei-o. E entrámos. Enquanto estudávamos Matemática, um pouco depois, Norberto começou a agir de forma... estranha. Sim, estranha. Começou a deixar os estudos de lado e a focar a sua atenção em mim... sempre a colocar a sua mão nas minhas pernas, sempre a dizer coisinhas pirosas.

- Viemos aqui para estudar ou para estar na marmelada? - perguntei.
- Sempre podemos fazer uma pausa...
- Podemos. - disse e ri-me.

Deitamo-nos sobre a cama e começámos a beijar-nos. Aquilo estava a ficar intenso. A certa altura, ele tentou tirar-me a camisola e aí apercebi-me de que tinha ido longe de mais. Puxei a camisola para baixo, e ele tentou puxá-la novamente.

- Pára. - disse eu.
- Que foi?
- Estamos a ir longe de mais... não achas?
- Desculpa? Eu acho que não. Não me digas que queres ir virgem para o casamento!
- Não me sinto preparada...

Norberto começou a beijar-me o pescoço, novamente. - Claro que sentes. - disse ele.
- Não, pára! - gritei.

Mas ele continuou. E eu vi-me forçada a esbofeteá-lo.
Fi-lo.
Norberto afastou-se e levantou-se.

- Que raio de namorada és tu que nem queres sexo comigo? - perguntou, e abandonou o quarto.

Fechei a porta do quarto à chave e envolvi-me nos lençóis, olhando o céu. Ai, como estava calmo... Sentia-me culpada pelo que acontecera. Norberto conseguira isso. Estava triste. Recostei-me sobre a almofada e fiquei assim deitada por muito tempo... Como gostava da sensação, do isolamento... Ingenuamente pensando que as minhas dores de cabeça e preocupações se ficariam por ali.
* * *

O porque da nossa ausência .Chique

Olá queridos!! Sei que desse lado, provavelmente, não estará ninguém, pois como tenho vindo a reparar, nós temos poucos visitantes no nosso blog. Isso entristece-me.
Bem, mas para aqueles que ainda continuam a ler as nossas confissões e peripécias, deve ter sido um pouco estranho o facto de termos estado chiquemente ausentes.
Isso tem uma chique explicação: nós fomos .Viajar. Viajámos porque nos propuseram um desafio aliciante.

Bom este post era apenas para vos dizer que vos vamos contar tudo, chiquesa por chiquesa, a nossa aventura .Chique. Uma aventura em que provámos que até uma chique tem conhecimentos de sobrevivência.

Até lá

Ps: quem vai escrever o primeiro post sobre a nossa aventura, vai ser a chique Fifi.


Beijo .Fashion

Uma homenagem .Chique

Oi gente chique que visita o nosso Blog!!

Hoje eu, Fifi, venho aqui escrever este .Chique post devido a uma coisa que aconteceu com um nosso leitor, de nome Flávio Gonçalves, e pretendo mostrar a nossa solidariedade para com ele.

Ontem à noite, estava eu aqui no meu computador portátil a adiantar a 3a parte da minha confissão de nome "Dilema .Chique" e a falar com as outras duas, quando a Fafa nos diz para visitarmos o blog de um nosso leitor, www.flaviosworld.blogspot.com. Aborrecida, fi-lo.

Então, comecei a ler o penúltimo post e, à medida que lia, não consegui conter as lágrimas. Porquê? Porque ele falava da morte do seu avô, que se deu no fim de semana que passou. E, ao ler aquilo, lembrei-me de uma coisa similar que se passou com uma tia minha, há 2 anos, e de como sofri aquando da sua morte.

A chorar, abri novamente a janela da conversação com a Bá e a Fafa e falámos sobre o assunto. A Bá estava também a chorar. A Fafa deu então a ideia para este post, e disse que deveríamos também falar sobre temas mais sérios, por vezes. Como ela disse no seu primeiro post, achamos imprescindível partilhar tudo convosco.

Bem, Flávio, queremos que você saiba que estamos aqui para o que precisar e que nos tocou com a sua confissão deveras .Chique. As melhoras...

Beijinho das três,

Fafa, Bá e Fifi

terça-feira, 27 de março de 2007

Mais uma amizade .Chique

Olá escassos e queridos leitores do nosso. Chique blog.

Ouvindo uma música para jovens, a Califórnia, escrevo mais um post. Eu, Bázita.
Hoje vou falar-vos de como conhecemos a nossa nova amiga, a Lulu.

Era dia 5 de Janeiro, e eu, a Fafa e a Fifi estávamos muito atarefadas na intrenet a divulgar o nosso blog chique. Depois de o passarmos tanto em hi5’s, como em blogs e chats, eis que uma mulher chique nos adiciona. Sim, a Lulu.

Tínhamos umas quinze pessoas a falar ao mesmo tempo e umas dez janelas abertas, e por isso, não lhe prestámos a atenção devida de início. Até porque, a maioria das pessoas que nos adiciona são gatunos ou gente mal-educada. Gente un-chique.

Quando finalmente lhe dissemos o tão esperado, por ela, “olá” ela já achava que estávamos na brincadeira, ou coisa assim.
Começámos por juntar todas na mesma conversa e nos apresentarmos, com uma chique calma. A pouco e pouco fomo-nos apercebendo de que estávamos a falar, não com mais uma impostora mal criada, mas sim com gente educada, chique, honesta.

Gostámos.

Começámos então a trocar ideias e opiniões. Sempre que estávamos online conversávamos com ela e tínhamos sempre assunto. Ora o que tínhamos visto naquele momento na Internet, ora sobre o nosso dia a dia, ou até das notícias que marcavam a actualidade. Assunto, não escasseava nunca.

Claro que a nossa amizade foi crescendo e a curiosidade de ver como ela era também. O que decidimos então? Marcar um encontro .Chique em casa da Fafa, para tomar-mos a chá das cinco.

O tão esperado dia, durante uma semana de ansiedade, finalmente chegou. Admito que estava com um nervoso chiquemente miudinho e a ansiedade secava-me a boca (ando sempre com uma garrafinha de água na minha carteira chique).

Tomei um banho quente de manha e, nem sei bem porque, arranjei-me melhor nesse dia do que num normal (e olhem que eu nos dias normais sou a mais chique de Viseu!). Usei os meus novos brincos chiques (que o meu querido e chique marido Henrique me deu) que caíram maravilhosamente com o meu vestido azul-escuro de estilo campestre. Pus também um chapéu com uma fita azul para intensificar o estilo. Sim, estava .Chique.

O meu relógio chique marcava 16:30 quando saí de casa com destino à casa da Fafa, aquela que ela tem em Viseu . Quando cheguei, para surpresa minha, já as três me esperavam, sentadas chiquemente numa mesa chique que a Fafa tem no jardim. Saí do carro sem tirar os olhos da Lulu (meu deus, ela era diferente do que eu imaginei. Era mais chique!) e fui ao encontro delas.

-Olá querida!!! – gritou histericamente a Lulu, correndo para mim como que um cão chique corre para um osso.
- Olá Lulu! Como correu a viagem, querida? - perguntei, só por educação. A verdade é que não me apetecia falar. Queria olhar para ela... falar já tínhamos nós falado, faltava-me olhá-la.

Meu Deus, ela era chique.

Começámos, minutos depois a bebericar o nosso chá de camomila, o meu preferido. A Lulu era uma desastrada: verteu chá no vestido chique, deixou cair a colher de prata chique e ela própria caiu da cadeira abaixo. Um desastre .Chique.

Sem dar-mos conta, as horas passaram e o meu relógio chique desta vez já apontava 20:22, pelo que a Fafa nos convidou a jantar. Nem convidei o Henrique, queria que fosse um jantar de que se falasse de assuntos de mulheres, sei lá.

Conversámos imenso ao jantar, assunto não faltava!

O jantar acabou algumas horas depois. E com alguma tristeza e uma lágrima no canto do olho, despedimo-nos da Lulu, que voltaria para casa, bem longe dali.

Gente chique, emocionei-me bastante a escrever este post, por isso o meu teclado está molhadíssimo. Sou uma lamechas… meu Deus.

Pronto, terei de termina-lo mesmo aqui, pois alem de o teclado já nem funcionar como deve ser, o meu filho (sim ele já voltou para casa!!! Obrigado na mesma a todos, pelos conselhos. Foram-me úteis) está a chamar-me para me mostrar a roupa chique que hoje comprou.


Até ao próximo post .Chique.

Comentem!

.Beijo

P.S.: A nossa ausência de duas semanas teve uma razão... saberão mais pormenores em breve!

quinta-feira, 22 de março de 2007

O meu dilema .Chique - Parte 2

Todos aqueles que conheceram Fátima Carreira durante a sua adolescência (no fim dela, para ser mais exacta), vos dirão que houve um ano em que a sua personalidade se modificou bastante, indo desde a rapariga mais ingénua da nossa turma até àquilo que seria a Fafa que nós conhecemos hoje, apenas com um pouco de rugas a menos. Sim, porque nem sempre “.Chique” fez parte do seu ADN.Esse ano começou exactamente em Fevereiro de 1987, há vinte anos atrás, portanto. Mas o que despoletou essa série de mudanças foi um acontecimento de que falarei mais à frente.

.16 de Fevereiro de 1987

Dormira mal durante a noite, lembro-me. Na minha cabeça, os eventos que se deram no dia anterior repetiam-se continuamente. Teria amanhecido há cerca de quinze minutos quando a minha mãe irrompeu pelo quarto, dizendo:


- Fifi, levanta-te e veste-te. Já sabes, vais para a escola e quero-te aqui às 2:00 da tarde.


Era o preço a pagar pela minha fuga do dia anterior, não poder sair ao fim das aulas com as amigas, durante um mês. A ideia preocupava-me um pouco, mas decidi não fazer muito caso e entrei para o chuveiro, onde pude esquecer as minhas incertezas. Quem seria aquela mulher un-fashion que me chamara de filha? Porque é que o meu Pai chique me proibira de ir à escola e me aplicara tal castigo por desobedecer? O que estaria a passar-se com Fafa? Como se sentiria Bárbara Mello, agora com cancro nos ovários? Veria Norberto naquele dia?, Rodei a torneira, fechando a água, e tomei o pequeno-almoço.


Os meus chiques pais já tinham saído de casa. Um cheiro insuportável pairava no ar. Um cheiro horrível. Desloquei-me à procura da origem daquele cheiro, um cheiro a… fezes. O meu pai esquecera-se de puxar o autoclismo chique. Fi-lo, enojada, e corri para apanhar o autocarro.

Naquele dia, o autocarro ia quase vazio. Nem Fafa nem Bá estavam lá. Reflecti no que me dissera meu pai na noite anterior. Achei melhor não os pôr a par do episódio un-fashion que sucedera à tarde, na entrada da escola: tesouros, ficaria um ano de castigo, sabia-o. Nessa manhã, no autocarro, as minhas suspeitas aumentaram. Logo depois de ouvir uma conversa estranhíssima sobre uma mulher que desconhecia e me queria ver, aparece aquela pessoa a chamar-me de filha. Estava baralhadíssima. Tanto que adormeci durante a viagem para a escola.


Senti algo a abanar o meu corpo, enquanto acordei vagarosamente, ainda me recordo.


- Adormeceu aqui, jovem. – dissera-me o motorista.- Credo. – disse, e saí dali o mais depressa possível, envergonhada.


Corri por entre a multidão de pessoas que percorriam os passeios, apressadas, e atravessei algumas ruas chiques até chegar à escola. Perto da portaria, hesitei, para recuperar o fôlego, e olhei em volta. O dia estava cinzento, que maçada. Subi as escadas da entrada discretamente, a caminho da sala, por fim.

A primeira aula passou rapidamente. Depois de tocar, reparei que Fafa saiu da sala apressadamente. Ia perguntar-lhe onde ia, mas, em vez disso, esperei que todos saíssem da sala e fiquei a sós com Bárbara, que estava sentada ao fundo da sala. Sentei-me perto dela.


- Calma, Bá. Vai tudo resolver-se, só tens de ter calma. E sabes que eu e a Fafa estamos aqui, sempre.
- Pois, eu sei… Mas, eu tenho cancro… Meu Deus! Tenho 19 anos e tenho cancro…! – disse ela, e desatou a chorar.
- Calma… - disse, sem saber o que proferir.
- Como queres que tenha calma? Se o tratamento resultar e eu sobreviver, é muito provável que nem possa ter filhos!

.Choque
Mais nada disse. Abracei-me a ela e assim ficámos, até a campainha soar. Fafa voltou despenteada, e isso preocupou-me.

- Passa-se alguma coisa, Fá? – perguntei.
- Não… Porque perguntas?
- Porque, sei lá, tens estado distante ultimamente.
- Pois… Tenho dormido pouquérrimo, credo.
- Pouquérrimo? Isso existe, sequer? – perguntei, mas o professor irrompeu pela porta adentro, obrigando-nos a suspender a conversa.


Nesse dia, só vi Norberto no segundo intervalo da manhã.Ao fim da aula, depois de pedir à Fafa que ficasse ali com Bá, a fazer-lhe companhia e a apoiá-la, enfim, como amiga chique que ela era, fui à procura de Norberto. Percorri a escola, atravessei o mar de alunos. Quando já perdia esperança, eis que esbarro com ele, junto das casas de banho.

- Bom-dia.
- Bom-dia. – respondi.

Escondidos na casa de banho dos rapazes, num compartimento sujo, passámos o resto do intervalo a namorar, como se de duas lésbicas se tratassem – ou gays, visto que era na casa de banho masculina –, até que a campainha tocou e nos separámos.


- Vemo-nos logo?
- Se estiver destinado, sim. Mas, muito provavelmente, não. – respondi.
Norberto riu-se. – E amanhã?
- A mesma coisa, mas há mais probabilidades.
- Ainda bem.
- Até amanhã. – respondi.
- Até amanhã. Amo-te.


A aula seguinte passou vagarosamente. A professora, lembro-me perfeitamente, era chata – e anã também. Estava ela a escrever no quadro, enquanto alguns alunos diziam piadas em voz baixa sobre o seu tamanho, quando uma funcionária bate à porta. Depois de um curto diálogo com a funcionária, a professora volta-se e diz:

- Filipa Rodrigues, alguém a quer ver urgentemente. Autorizo-a a abandonar a aula, mas despache-se.

“Credo”, pensei eu. “Credo .Chique, quem seria?”Saí da sala e percorri os corredores da escola, acompanhada pela funcionária. Quando vi quem me esperava, quase voltei para trás.


* * *


A mesma mulher do dia anterior, que me chamara de filha, esperava-me. Aproximei-me dela, e a mulher disse-me que queria falar comigo.


- Posso saber o motivo de tanta insistência? – perguntei.
- Minha filha…- Pare de me chamar filha!
- Mas eu sou tua mãe…
- Desculpe, eu tenho uma mãe – chama-se Lurdes Rodrigues. Você é uma desconhecida.
- Acredita, não sou desconhecida nenhuma. – disse ela, com o seu sotaque brasileiro, levantando a camisola. – Tu saíste deste ventre!
- Então prove-o. – disse, em jeito de brincadeira.
- Queres provas?
- Sim.
- Então vais tê-las. Voltaremos a ver-nos. – disse, e afastou-se.
- Como se chama? – gritei eu. – Diga-me isso, pelo menos.
- Arminda Terra. – respondeu, e afastou-se, desaparecendo.


Arminda… Terra? Imaginem como fiquei. Minutos depois, voltei para a aula, ainda a processar tudo o que se passara. Provas? Arminda Terra? Minha mãe? Entrei na sala, e procurei não pensar no assunto. Porém, pouco depois, antes do final da aula, pensei “Então se aquela mulher for mesmo minha mãe, os meus pais adoptaram-me”.
.Choque.
Reflecti melhor. Não poderia confiar numa desconhecida. Pelo menos não agora, tão precocemente. E eis que tive uma ideia para o que fazer.

As aulas tinham terminado há minutos, faltava pouco para as 2 horas da tarde. Eu, Fafa e Bá fazíamos o habitual percurso escola – paragem do autocarro, um pouco silenciosas. Normalmente, eram passeios repletos de gargalhadas, fofocas e conversas animadas entre três adolescentes muito amigas, mas não naquele dia. Estávamos enclausuradas nos nossos pensamentos. E assim continuámos até ao fim.

- Meu Deus, que horror. – disse eu, quando cheguei a casa.


À noite, eu e os meus pais chiques jantávamos juntos. O ambiente estava silencioso, inquietante. Eu, nervosa, comia devagar. Os meus pais falavam ocasionalmente, sobre trabalho. Até que decidi que tinha de falar.

- Quem é… Arminda Terra? – perguntei, hesitante.

Foi então que o meu pai, que comia uma chique cocha de frango, tossiu. E tossiu novamente. Aflito, ficava vermelho do pescoço para cima, como um tomate podre. Eis que, no meio da aflição, me apercebo de que se estava a engasgar com o osso do animal.

- Pai!
- Filipa, chama uma ambulância! – gritou a minha mãe, batendo nas costas do meu pai.- Jesus! – gritei, e chamei uma ambulância.


No hospital, eu e a minha mãe esperávamos por notícias, sentadas numa sala apinhada de gente. Idosos, ciganos, pessoas un-chiques – de tudo um pouco, e eu estava lá no meio, com as narinas entupidas devido ao cheiro a suor que pairava no ar. Olhei para a minha mãe, que parecia nervosa. Não sabia o que fazer. Olhei em volta, e perguntei-lhe:


- Mas… Quem é… Arminda Terra?
- Cala-te ou ainda levas aqui. – gritou a minha mãe. – Já bastou o teu pai se engasgar.
- Credo.
- Cala-te com o credo!

Dias depois, no final do almoço num café chique, eu e a Bá (que começara a fazer tratamento), caminhávamos até à escola. O dia estava solarengo, agradável. Continuámos a percorrer as ruas cheias de gente, até à escola. Quando lá chegávamos, apanhei o maior choque da minha vida até ali.

- Fátima! – gritei.

* * *

sábado, 3 de março de 2007

O meu dilema .Chique

Oi jóias!

Começo então este chique post por explicar o porquê de escrever sobre acontecimentos que se passaram há já alguns aninhos: primeiro, porque não tenho grandes acontecimentos que me tenham ocorrido recentemente para vos contar, segundo, porque foi uma coisa que me marcou e que alterou o rumo da minha vida.

O ano de 1987 foi difícil para todas, não só para a Fafa, como vão poder descobrir ao ler o que escrevo agora mesmo.

Lembro-me perfeitamente daquele dia, 14 de Fevereiro de 1987, como se fosse hoje. Naquela altura eu, Filipa Rodrigues, tinha os meus tenros 19 anos, e pouco sabia da vida além de que devia estudar muito para atingir resultados brilhantes, não perder a virgindade antes do casamento e lutar pelo meu sonho: ser professora.
O dia começara cedo e frio, em Cascais, e eu dirigi-me para a escola de camioneta, uma camioneta un-chique e algo velha, acompanhada da Fafa e da Bá.

- Logo não vou poder ir comer gelado convosco. - disse a Fafa.
- Porquê? - perguntou a Bá.
- Tenho que estudar.
- Mas é dia dos namorados... - disse eu.
- Para vocês.

Nessa altura, eu nutria sentimentos por um amigo da minha turma, um rapaz bonitíssimo cujo nome horrendo era Pascoal (como ele era conhecido entre nós, pois eu tratava-o pelo seu primeiro nome, Norberto) e esperava que naquele dia ele me mostrasse se era recíproco, depois de algumas semanas a dar-me sinais de que o que ele sentia era mais do que amizade.

- Vejam lá se têm juízo, vocês... - alertou-me uma ingénua Fafa, à tarde, quando uma amiga nossa, a un-chique Laurinda, me veio dizer que Norberto queria falar comigo na sala 101.
- Fifi, já sabes, não mostres que estás nervosa e não te atires de cabeça! - disse-me a Bá, enquanto me levavam pelos corredores da escola até à distante sala 101.

Norberto esperava-me, sentado sobre uma mesa, com as mãos a tremer e um sorriso sexy naquela cara que me fazia pensar loucuras qu não devia, segundo a educação religiosa que e fora dada. Entrei, e elas ficaram à porta, de certeza a escutar tudo.

- Olá.
- Olá. - respondi. - Então, mandaste-me...

Norberto Pascoal não me deu tempo de terminar aquela frase, amarrou-se a mim e deu-me um beijo longo e cheio de saliva, saliva que engoli misturada com a minha e me fez sentir uma rapariga realizada. Depois, outro. E outro. Deitámo-nos sobre a mesa, eu em cima dele, a beijarmo-nos, até que o som da campainha horrenda tocou, separando-nos.

- Até logo. - disse eu.
- Até logo.

Não consegui estar muito atenta nas aulas que tivemos à tarde, como podem imaginar. Só conseguia pensar naqueles escassos 15 minutos passados na sala 101. Na aula de Língua Portuguesa, o professor chegou a advertir-me para estar atenta, caso contrário me arranjaria uma cama onde dormir. Eu ri-me, e tentei prestar mais atenção à sua aula, sem sucesso. No entanto, uma hora mais tarde, durante a aula de Matemática, uma coisa chamou a minha atenção: Fafa tinha faltado à aula. Todos falavam sobre isso. A Fafa, aluna sem uma falta sequer, faltara? Até a professora comentou.

- Alguma coisa deve ter acontecido. - disse eu.
- Pois, só pode. - respondeu a Bá.

A aula acabou e, à saída, encontramo-nos com Fafa. Uma coisa denunciou que algo de errado acontecera: ela já não tinha batom nos lábios, e eles estavam com aquele ar de que tinham beijado alguém.

- Estiveste aos beijos a alguém? - perguntou a Bá, e eu ri-me com ela.
- Não, credo. Aconteceu um imprevisto. Vou para casa, tenho que estudar. - respondeu a Fafa.

Eu e a Bá ficáms ali paradas, ao portão, a especular o que se tinha passado. Depois, Norbeto apareceu e eu fui com ele até minha casa, enquanto que a Bá decidiu ir para sua casa, tomar banho e vestir-se para à noite irmos comer um gelado a um café chique, de nome "Café, Doce Café". Despedi-me do Norberto com um beijo discreto, nas traseiras do prédio onde morava, e entrei em casa. Uma conversa entre o meu pai e a minha mãe tinha lugar na sala, e eu pus-me à escuta.

- A Arminda esteve cá... - ouvia a minha mãe.
- Aqui...? Em casa...?
- Não, no meu trabalho.
- Outra vez??
- Sim, não sei que faça... Ela insiste em ver a Filipa...
- Temos de fazer alguma coisa, Lurdes.
Entrei na sala, e perguntei o que se passava, quem era a tal Arminda. Nada me disseram. Desculparam-se, e desviaram o assunto.

- Amanhã não vais à escola, Filipa.
- Mas, Pai! Amanhã tenho teste a Biologia e não posso faltar!
- Filha, já falei...
- Então diz-me, porque é que não posso ir?
- Porque eu digo que não, ora! - gritou comigo. - E talvez não vás depois de amanhã, também!

Indignada, nada mais disse, refugiei-me no meu quarto. Sabia que no dia seguinte faltaria ao teste de Biologia e, ainda mais importante, não estaria com o Norberto no dia seguinte. Liguei à Bárbara, às escondidas. Mas ela não atendeu. Tentei novamente, mas nada. O que se teria passado? Adormeci, nessa noite, sem jantar.

Debruçava-me, no dia seguinte, sobre a escada de incêndio chique que o meu prédio tinha. Com mochila às costas, desci a enorme escadaria de metal, quando o sol nascia, sem o conhecimento de meus pais. Não me podiam prender ali, simplesmente. Senti-me uma criminosa a fazer aquilo, tive vontade de voltar para trás. Mas, se o fizesse, teria a média arruinada. Continuei a descer, e deixei o meu bairro com uma expressão de infelicidade, como nunca tinha sentido.

Ao longo do dia, aproveitei para estar com o meu Norberto, namorámos e passeámos, felizes. O teste correu-me bem, ainda me lembro, e, pensei eu, compensou a fuga. Mas havia duas coisas que me preocupavam, e eu ainda não sabia do que aconteceria no segundo intervalo da tarde. Uma delas era a Fafa, que mal a vi durante o dia. E a outra era Bá, que esteve triste e cabisbaixa o dia inteiro. Não falava, nem foi almoçar comigo nem com a Fafa, com de costume. Nem sequer estudámos um pouco antes do teste, como habitualmente o fazíamos.

Eram dezasseis horas no meu relógio chique quando eu abandonei a sala 79 para ir apanhar um pouco de ar. O recinto estava cheio de gente, cheio de alunas un-chiques a falar de moda e rapazes a apreciá-las. Caminhei por entre a multidão até à entrada da escola e sentei-me nas escadas ásperas. Eis que uma mulher un-chique começa a subir as escadas e se aproxima de mim.

- Filipa? - perguntou ela. Fiquei horrorizada.
- Sim...?
- Filipa, minha filha! - gritou ela, e abraçou-me.
Recuei dos seus braços e subi uns degraus, confusa com a situação.
- Quem é você, raios?
- Filipa, temos de falar, minha filha... vem comigo! Esperei tantos anos, e tu estás tão magricela, coitada!

Fugi dali para fora, e tranquei-me na casa-de-banho. Como o fazia sempre numa situação em que não sabia como agir: fugia para um sítio onde pudesse pensar, escapar ao que se passava. Porém, segundos depois, ouvi um choro abafado vindo do compartimento ao lado. Não era a única ali. Pus um pé sobre a sanita e trepei a fina parede que nos separava, para ver quem era.

- Bá? - perguntei.
Ela voltou o seu olhar para mim, lembro-me perfeitamente da sua expressão, e continuou a chorar. Desci e ela destrancou a porta.
- Bá, que se passa? - perguntei, mas ela não me contava. - Que se passa, fala comigo!!!
- Fifi... Eu... Tenho... Cancro. - respondeu, e quase me veio o coração à boca.
- O quê, como???
- Nos ovários. - disse, e eu apenas a abracei, com força, e disse uma quantidade de coisas para a acalmar, de alguma forma. E ali ficámos, por mais uma ou duas horas.

* * *